Uma mulher forte


Toda família tem algumas características e tradições que a identificam. A minha, além de comer muito e falar quase na mesma proporção, também tem o traço marcante de ser composta de mulheres fortes. São elas que, muitas vezes tomam as decisões mais importantes, estudam, trabalham e sustentam as famílias materialmente e/ou afetivamente e são líderes onde quer que pisem. São mulheres que vem descobrindo sua força à partir das necessidades e dificuldades que a vida coloca diante delas.
E essa tradição de força e coragem não surgiu do nada. Como toda tradição, sempre existem, aqueles que iniciam algo novo e servem de exemplo para os que vem depois. E o grande exemplo da minha família é a senhora Zilda Mustafá Bornia, a Dona Zilda para alguns, Tia Zilda para outros, ou simplesmente Vó Zilda.
Uma mulher muito decidida e à frente do seu tempo. Já começou escolhendo ela mesma o homem que seria seu companheiro por muitos anos, algo, que não era muito o costume da época.
Ela é também uma mulher de muitos talentos e muita criatividade para lidar com as dificuldades da vida. Muitas vezes já ouvi a história de quando morava em Rochedo, uma cidadezinha no interior do estado. Naquela época, o açougue não vendia carne todos os dias e, para complementar a alimentação da família, pegava a varinha de pescar e ia para o rio. Depois começou a fazer bolos para vender e acabou se tornando a boleira mais famosa da região de Rochedo e Corguinho, tendo suas tortas disputadas em leilões. E, quando morava em Rio Verde, começou a costurar umas toucas de gorgurão, que se tornaram a sensação das madames, além dos famosos tapetinhos de retalho, que até hoje presenteia amigos e parentes.
Mas nem só a dificuldade marca sua vida. A animação também é sempre presente. É dona de uma inconfundível gargalhada. Sua casa é sempre cheia. É o lugar do fervo, da muvuca. Já até apareceu na televisão de tão animada que estava a festa. É sempre freqüentada por muitos amigos, amigos dos filhos, amigos dos amigos dos filhos, que também acabam se tornando seus amigos. Há também os agregados, pois volta e meia aparece alguém que está de passagem pela cidade ou temporariamente sem lugar pra morar. Ela acolhe a todos com muito carinho e alguma comidinha gostosa. E é incrível o poder que tem de fazer a pessoa contar a vida toda em 10 minutos de conversa.
E essa animação toda não é só para receber as pessoas em casa. Ela também tem muita disposição pra curtir fora de casa. Por vários anos acompanhava o ritmo da turma que se reunia pra curtir os lendários bailes de carnaval do Clube Monte Líbano. Viajou pra Joinville pra me acompanhar num Festival de dança onde foi até pra boate, organizou o café da manhã coletivo da galera e foi eleita a mais encrenqueira da delegação. Não basta ser vó, tem que participar! Falando nisso, sua relação com os netos é um capitulo à parte.
Uma dedicação admirável. Faz de tudo por nós. Já se despencou até São Paulo pra acompanhar nascimento de neto, substituiu as mães de todos nós em vários momentos estratégicos, sem falar nas moedas que ela junta num cofrinho o ano todo e no tapeware de bolo de cenoura que todos os netos ganham todo fim de ano, mesmo que chova canivetes.
Em de fevereiro 2005 ela deu mais uma demonstração de força. Perdeu o vô Arlindo, seu companheiro de vida tantos anos. Mas ela conseguiu ser mais dinâmica que a vida. Ao invés de ficar triste em casa, seguiu a vida como se ela tivesse mesmo uma ordem natural. Sabe aquela expressão “melhor idade”? É a expressão politicamente correta para chamar os idosos. Ela personifica esse conceito. Parece que a vida acabou de começar para ela. Hoje ela freqüenta o grupo da terceira idade, onde tem aula de informática, dança de salão, espanhol, viaja etc.
Obrigada Vó, por existir e fazer todos os nossos dias melhores, mais doces e felizes.
Parabéns!!!


*Esse foi um suposto discurso para o aniversário de 70 anos da minha avó.

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